leci_brandaoO sorriso largo, o jeito doce e ao mesmo tempo determinado são marcas registradas de Leci Brandão. E é com essas características que ela escreve
uma história com dois capítulos paralelos e complementares. São 40 anos de música e seis de política como deputada estadual pelo PCdoB em São
Paulo. Estado que a carioquíssima de Madureira, e mangueirense, escolheu para viver há mais de duas décadas. No mês da consciência negra, Leci conversa  com o Direito de Opinião sobre cultura, política, preconceito e esperança.

Direito de Opinião: Leci, samba e democracia sempre estiveram na sua vida. De que forma essas dois temas se encontraram e se complementaram?

Leci Brandão – O samba, desde seu nascimento, é uma manifestação do povo, nascida e criada como resistência cultural do povo negro que foi perseguido e  marginalizado. Por muito tempo o samba foi a voz da periferia. Através do samba o povo cantava suas dores e amores. Assim como eu, muitos sambistas  fizeram e fazem da sua música um instrumento para falar de questões sociais, de injustiças e das nossas alegrias também. Então, acho que essa  identificação do samba com a democracia ela é natural, porque o samba é, em essência, democrático.

Direito de Opinião: E como você concilia a política e a música?

Leci Brandão – Hoje, a prioridade é o mandato. Continuo fazendo shows em todo o país, nos finais de semana, mas durante a semana estou na Assembleia  Legislativa. E aqui não estou longe dos assuntos da cultura. Sou vice-presidente da Comissão de Educação e Cultura da Alesp. Nosso mandato tem  apresentado muitos projetos na área de cultura e atuado junto aos professores nos assuntos relacionados à educação.

Direito de Opinião: Quase 130 anos depois do fim oficial da escravidão no Brasil o racismo é questão presente. No mês da Consciência Negra, como você avalia o momento do Brasil hoje?

Leci Brandão – Nosso país passa por um momento crítico. Só se fala em crise e penso que, de fato, estamos em crise: econômica, política e de ideias. A de ideias é, em nossa opinião, a mais grave, porque com ideias reacionárias ninguém avança. O país e o povo andam pra trás. Os poucos direitos e liberdades conquistadas estão ameaçados. E em momentos de crise, os mais vulneráveis são os primeiros a sentir. A população negra é a maior vítima do desemprego e da violência que decorre das intolerâncias. O Mapa da Violência aponta que as mulheres negras são as maiores vítimas da violência   doméstica. Depois de algumas conquistas que tivemos após décadas de luta organizada, como as cotas e a criminalização do racismo, estamos assistindo à ação de um Congresso reacionário que só pensa em extinguir ou reduzir direitos, colocando na pauta política questões como maioridade penal e  terceirização que, bem sabemos atinge principalmente a população negra.

Direito de Opinião: Como manter o ânimo e a determinação para seguir em frente diante do avanço das forças reacionárias?

Leci Brandão – Acho que, apesar de tudo, nunca podemos perder a esperança. Aqui no nosso gabinete vêm muitos jovens cheios de ideias, animados para lutar contra tudo que está de errado aí. Sempre que falo com esses jovens, principalmente com as jovens negras e da periferia, eu fico animada e acho que vale à pena continuar lutando pelo o que eu sempre acreditei e cantei nas minhas músicas.

Direito de Opinião: E qual a música que você escolheria para encerrar nossa entrevista?

Leci Brandão – “Anjos da Guarda” foi uma música que eu fiz após assistir, pela TV, professores apanhando da polícia durante uma manifestação. Aquilo me marcou muito.

Anjos da Guarda

Professores
Protetores das crianças do meu país
Eu queria, gostaria
De um discurso bem mais feliz
Porque tudo é educação
É matéria de todo o tempo

Ensinem a quem sabe tudo
A entregar o conhecimento
Na sala de aula
É que se forma um cidadão
Na sala de aula
Que se muda uma nação